Existem muitos contos orientais que abrem nossa mente para
temas interessantes, várias dessas histórias terminam caindo como uma luva em
certas situações, e às vezes até parece que já vivenciamos algo parecido. Um
conto que ouvi certa vez, me abriu os olhos para a quantidade de coisas que
fazemos e muitas vezes não sabemos por que, normas e procedimentos que existem
mas ninguém sabe o porquê ainda são utilizados, mesmo quando estão
ultrapassados e impedem o processo criativo.
Já ouvi este conto sob diversas óticas, e com várias
personagens principais diferentes, vou conta-lo sob o título de desamarre o
gato, mas a personagem poderia ser um galo, cachorro, vaca, rato, pombo, enfim,
isto não mudará em nada a moral de nossa história.
“Um antigo mosteiro chinês, no alto da montanha de Song
Chan, era o centro de uma paz absoluta, e monges de toda a China procuravam
aquele monastério tão tradicional e reservado. Todos os dias sempre às quatro e
meia da manhã, o mosteiro se reunia em silêncio para a primeira meditação
matinal, este momento era sagrado para os monges, e o silêncio da madrugada
deveria sempre ser respeitado, mas em uma manhã de verão esse silêncio sagrado
foi quebrado por um gato, o animal procurando comida e abrigo resolveu morar na
cozinha do templo, e neste dia ele começou sua busca por comida caçando os
ratos que também se instalaram por ali, o bichano iniciou uma barulhada
insuportável, derrubando panelas, vasilhas, miando e correndo atrás dos ratos
da cozinha, isto não seria problemas para os monges se o gato não tivesse
escolhido justamente o horário da madrugada para realizar suas caçadas,
atrapalhando a concentração dos momentos de meditação.
Sob a ótica de conduta dos monges, eles deveriam ser
piedosos com o animal, e nunca enxotariam o gato do mosteiro ou lhe fariam
algum mal, durante alguns dias eles tentaram aceitar o barulho e deixar o gato
livre, mas a arruaça foi ficando insuportável, e o mestre abade do tempo
resolveu tomar uma providência, pedindo que os monges amarrassem e amordaçassem
o gato durante os períodos de meditação e o soltassem logo após a prática
matinal.
Este procedimento foi feito durante muito tempo, resolvendo
o problema de barulho durante as meditações da madrugada, os anos se passaram,
o mestre abade morreu, e mesmo assim continuavam a amarrar o gato diariamente
durante os momentos de meditação matinal, mais alguns anos se passaram e o gato
morreu, e os monges preocupados, resolveram encontrar outro gato para colocar
no lugar do antigo, e o novo gato continuou sendo amarrado diariamente.
As décadas se passaram, e novas gerações de monges e mestres
mantiveram o hábito diário de amarrar o gato, que acabou se tornando um
importante ritual naquele famoso e respeitado templo, e a essa altura, ninguém
mais sabia o porquê de amarrar o gato, mas justamente por isso, aquele ritual
se tornou muito importante, sendo uma característica famosa daquele monastério.
Monges veteranos cobiçavam a importante função de amarrador de gatos, manuais
foram criados com as normas e procedimentos de todo o processo para amarrar o
gato, ensinando como pegar o gato, que tipo de corda e mordaça utilizar,
quantas voltas com a corda deveriam ser dadas, que tipo de nó poderia ser
feito, enfim, uma verdadeira enciclopédia do ritual de como amarrar e amordaçar
o gato.
O tempo passou, e vários grupos de estudiosos começaram a
dedicar suas vidas a estudar os manuais e a origem do ritual sagrado de amarrar
o gato. Estes grupos se dividiram, e começaram a divergir sobre várias
questões, várias interpretações surgiram, e correntes de seguidores começaram a
defender teorias diversas sobre o ritual sagrado, estas divergências geraram
conflitos internos, e as origens e processos do ritual passaram a ser o ponto
de discórdia entre os dois grupos formados. Um dos pontos principais de
divergência era que, um dos grupos acreditava que somente gatos brancos
poderiam ser amarrados, pois o branco simbolizava a pureza da alma e a evolução
espiritual, o outro já defendia que qualquer gato poderia ser amarrado e que
isto não fazia diferença nenhuma e resolveu ir embora do famoso monastério para
fundar uma nova ordem, que daria continuidade ao ritual da forma que achavam
correta, sendo assim, estes dois grupos passaram a divergir constantemente e
não mantiveram mais contato, pois o primeiro era acusado de ser radical e o
segundo de ser exatamente liberal. Após a separação, novas correntes começaram
a se formar, e um terceiro grupo começou a se formar, divulgando uma teoria que
unia as duas linhas divergentes, eliminando seus defeitos e absorvendo suas
qualidades.
O antigo monastério da montanha de Song Chan foi aos poucos
se dividindo, e hoje nenhuma das linhagens existe mais, e o ritual de amarrar o
gato caiu no esquecimento...”
Este conto é muito interessante para evidenciar o que
acontece em muitas empresas e instituições, é muito comum ver pessoas que
cumprem normas e procedimentos totalmente sem sentido e sem fundamentos, que
simplesmente são feitos porque alguém que já os fazia antes, e terminam sendo
os fatores geradores da estagnação de muitas empresas.
A falta de questionamento e análise, afunda organizações,
impede o processo criativo e inovador, emperrando o desenvolvimento dos
negócios, precisamos desamarrar os gatos de nossas empresas, e desmistificar
atitudes, e conceitos retrógrados, muitas vezes sem sentido e ultrapassados.
Analise sua vida profissional e pessoal, e perceba quantos
gatos existem aguardando para serem desamarrados...
Pense nisso, e boa sorte!!!