Esta história que contarei, não faz tanto tempo, e é
verdadeira.
Era uma loja muito limpinha, muito arrumadinha, lá pros
lados de Jequié, no interior da Bahia. Era o primeiro supermercado da cidade,
reluzente de novo, porém sem alma viva para comprar.
Acontece que o tabaréu e a tabaroa – nome que se dá ao
caboclo, caipira regional – se assustava com tamanho luxo.
Acostumado a comprar nas feiras das praças, espantar as
moscas que pousavam na carne pendurada nos varais das barracas, o tabaréu não
tinha coragem de enfrentar tanta limpeza e aquela modernidade toda.
Onde já se viu sujar o piso de cerâmica com a botina?
Imaginava que seria expulso do supermercado. Botina acostumada ao chão de terra
batida e à poeira das estradas e das praças da cidade onde seu dono comprava
galinha viva, cabrito, porco retalhado à machadinha, carne-de-sol, jerimum,
verduras, legumes, frutas, feijão-de-corda verde – medido aos litros em lata de
óleo vazia – e tantos outros mantimentos.
Um belo dia um tabaréu desavisado apeou do jegue, entrou na
loja, amarrou o animal no primeiro checkout que viu e se sentiu um rei, sozinho
em uma loja moderna.
Foi enchendo de mercadorias o saco de pano que levava às
costas, passou pelo caixa e pagou.
Desamarrou o jegue, que a essa altura tinha deixado no chão
um monte de lembranças tanto sólidas quanto líquidas, mas igualmente
malcheirosas, para espanto dos funcionários atônitos. Para amenizar a fedentina
e absorver a umidade, o gerente mandou espalhar serragem pelo chão, depois de varrida
a loja. Em seguida a loja lotou.
A partir desse dia virou lei espalhar serragem na entrada da
loja antes de abrir as portas. É verdade que o supermercado perdeu aquele ar
limpinho, arrumadinho, porém se tornou um sucesso de vendas.
Nesse dia pensei:
quando chegar em casa, vou rasgar o livro daquele teórico americano
idolatrado por milhares de professores e alunos do mestrado.
Seguindo os passos daquele autor de marketing, tudo na loja
estava certo, ela era perfeita, exceto no sertão da Bahia, exceto para o
tabaréu.
Não rasguei o livro, para infelicidade do autor, pude
contrariá-lo dezenas de vezes ao longo desses anos, e confesso que hoje estou
convencido de que: “Não é o consumidor que escolhe a
loja, é a loja que escolhe o consumidor. Mesmo sem nenhuma sutileza, foi isso
que disse o jegue...”